O Impacto da Acumulação no Contexto Familiar (Por Vanessa Tagliari)

Conviver com uma pessoa que acumula pode ser brutalmente impactante para a vida dos familiares. Por um lado, existe o familiar que quer e tenta ajudar de todas as formas que sabe, mas nem sempre este familiar tem conhecimento profundo sobre o que realmente é o transtorno de acúmulo e acaba por “meter os pés pelas mãos”, por outro lado, significa que este familiar entende que existe um problema maior do que uma simples desorganização e essa vontade de ajudar é legitima.

Algumas atitudes tomadas na tentativa de ajudar podem ser extremamente prejudiciais para quem sofre com o transtorno de acumulação.

Eis alguns exemplos:

  • Deitar fora os objetos da pessoa que acumula, sem o conhecimento e consentimento da mesma: além de não proporcionar ajuda pode agravar a situação emocional de quem acumula, pois quando ela notar que foi lhe retirado algo que para ela tem imenso valor sem o seu consentimento, pode entrar em crise de ansiedade e até depressão.
  • Pode também tornar-se agressiva com quem retirou os seus pertences e isolar-se mais, evitando assim a visita deste familiar se este não habitar na mesma casa.

Os familiares que convivem com uma pessoa em situação de acúmulo sofrem também e muito, pois ficam tristes e muitas vezes veem-se impotentes diante da situação. Podem acabar por desenvolver um sentimento de incapacidade, vergonha, e alguns familiares chegam até a um ponto extremo de pensar em suicídio.

Eu já atendi familiares de pessoas em situação de acúmulo, que reportaram esse tipo de pensamento, por se sentirem demasiado frustradas por não conseguirem ajudar e por terem que conviver com a acumulação alheia.

Os familiares referem o sofrimento por não terem um espaço próprio dentro da casa. Muitas vezes ficam apenas com um pequeno espaço numa cama para dormir, não existe espaço limpo para confecionar uma refeição, tomar um simples banho pode ser uma tarefa demasiado complicada quando se tem a casa de banho obstruída por objetos diversos e muitas vezes com lixo e animais em excesso.

Alguns familiares de pessoas em situação de acúmulo também relatam sobre como a acumulação deste familiar afeta diretamente a sua autoestima. A pessoa deixa de se amar, deixa de ser produtiva no seu trabalho, pois a frustração de não conseguir ajudar o “acumulador” e a convivência com a acumulação durante vários anos afetam diretamente o seu estado mental, gerando vários tipos de sentimentos negativos.

As consequências da convivência com uma pessoa que acumula são variadas. Entre elas estão o divórcio, o distanciamento emocional e físico, conflitos dentro de casa, crise emocional nos filhos, depressão, entre outros.

Isto já para não falar nos casos onde há crianças envolvidas numa situação de acúmulo. Recentemente num caso em Portugal, que foi noticiado pelos meios de comunicação nacionais, em que  a limpeza da casa foi efetuada pela própria  DEATHCLEAN, havia uma criança de 4/5 anos envolvida num caso de acumulação extrema. O quadro final é sempre muito triste, pois a criança acabou por ser institucionalizada após o internamento psiquiátrico da mãe e da avó que acumulavam.

Casos como este servem de alerta para todos nós, pois o transtorno de acumulação é um transtorno mental que deve ser levado a sério por todos. É algo grave, perturbador e mais comum do que imaginamos.

Então, a maneira mais eficaz de prestar ajuda a uma pessoa que acumula é prestar atenção aos primeiros sinais, tendo em mente que:

A principal característica de quem sofre do transtorno de acumulação é o APEGO EXCESSIVO ÀS COISAS.

 Bem antes de ter a casa cheia de objetos em excesso, úteis, inúteis e até lixo, a pessoa demonstra sinais que podemos observar.

Tudo parece inofensivo, por isso é tão difícil de identificar como um problema de saúde mental.

Alguns exemplos de coisas que parecem inofensivas:

  1. Uma mãe que já tem os filhos adultos e ainda guarda todas as roupinhas de bebé, não uma nem duas lembranças, mas várias ou TODAS as roupinhas de bebé, sem nenhuma justificativa aceitável para guardar e também não permite que ninguém mexa nestes pertences.
  2. Guarda diversos tipos de coisas aleatórias como desculpa de que pode precisar algum dia, não se desfaz de nada, nunca, e não existe um critério de organização para guardar.
  3. Criança ou jovem que demonstra muita dificuldade em se desapegar dos seus pertences, atitudes que inocentemente classificamos como “normais para a idade”. Então, os pais acabam por tirar e fazer doação das roupas e dos brinquedos às escondidas, para evitar o stress de ter que lidar com o apego daquela criança. Muitas ainda demonstram apego aos bens comuns da casa, como por exemplo uma criança que fica muito aborrecida quando os pais decidem trocar o sofá ou o frigorífico.
  4. Compra alimentos em excesso, ao ponto de não conseguir consumir tudo e assim eles estragam-se no frigorífico e na despensa, e mesmo assim recusa-se a deitar fora, com a desculpa de que passou muita necessidade na infância ou qualquer outra justificativa.

Todas essas características podem ser observadas com atenção e empatia. Sempre que desconfiar de que uma pessoa possa estar a acumular em excesso, procure ajuda de profissionais como psicólogos, psiquiatras e assistentes sociais para a orientar e lhe dar o suporte necessário, para oferecer ajuda efetiva a esta pessoa.

Concluindo, se notar que alguém da sua convivência demonstra apego excessivo às coisas, se irrita quando lhe fala em fazer escolhas e deitar algumas coisas fora, mantém diversos tipos de itens guardados sem o mínimo critério de ordem e limpeza, considere buscar ajuda de um profissional de saúde mental para que o disgnóstico seja feito o quanto antes e assim a ajuda será realmente efetiva para esta pessoa.

Autora: Vanessa Tagliari – Organizadora de Espaço.

Vanessa TagliariOrganizadora profissional desde 2016, com certificação profissional comprovada e onde atualmente se encontra a especializar na resolução de problemas de desorganização crónica e acumulação excessiva.
A Vanessa, ajuda as pessoas a encontrarem a organização dentro de si através da organização dos espaços físicos. Saibam mais sobre o trabalho da Vanessa Tagliari em: Vanessa Tagliari – Organizadora Profissional

Contacto: vanessatagliariorganizadora@gmail.com ou +351 919 792 565

** Este artigo contou com a revisão de: Jacqueline Moreno – Organizadora Profissional (Minas Gerais – Brasil). Contacto: jacquelinemorenotsilva@gmail.com

 

PALAVRAS-CHAVE: Acumulação compulsiva; Hoarder; Hoarding; Deathclean; Organização; Organizadora; Vanessa Tagliari; Distúrbio; Lixo; Resíduos; Limpeza; Tralhas